Palco das gravações do filme “A Viagem do Seu Arlindo”, o distrito de Pedra Branca, em Vargem Alta (ES), recebeu há pouco mais de cinco anos a certificação de comunidade remanescente quilombola. Incrustada nas montanhas capixabas, conhecidas tradicionalmente pelas comunidades de descendentes europeus, Pedra Branca é apenas uma entre as várias comunidades com descendentes de africanos escravizados localizadas na região. Mas as tradições que ligavam os moradores do distrito com seus antepassados vinham pouco a pouco sendo esquecidas. Caxambu, contação de histórias, receitas tradicionais iam se perdendo no tempo. A chegada de uma equipe de cinema na comunidade, no entanto, mobilizou os moradores e deu início a um processo de resgate dessa cultura: “A visibilidade que o filme trouxe para a comunidade foi legal e isso incentivou a mobilização deles. Formou-se novamente um grupo de caxambu, que existia aqui quando os mais velhos eram crianças. Alguns lembravam dos versos, outros do que viram das rodas de caxambu de antigamente”, conta Sheila Altoé, diretora do filme, selecionada pela sexta edição do Revelando os Brasis.
Outra ação criada pela comunidade a partir da mobilização para o filme foi o Dia Q (Dia do Quilombo). Todo dia 20 de cada mês será dedicado a dançar o caxambu e relembrar antigas tradições, como a sopa de banana e os bolinhos de banana.
Gravações – “A Viagem do Seu Arlindo” foi o primeiro filme da sexta edição do Revelando os Brasis a ser rodado, de 6 a 10 de novembro. Para Sheila, o desafio de dirigir pela primeira vez uma obra audiovisual foi mais tranquilo por causa do apoio que recebeu de toda a equipe. “As gravações foram maravilhosas. A gente não tem muita noção de como é dirigir um filme, então a equipe toda foi muito importante. O pessoal da comunidade se envolveu muito, participou mesmo”, conta.
Os moradores de Pedra Branca trabalharam em várias funções do filme, inclusive atuando. Seu Sinésio da Cunha fez o papel principal em sua estreia como ator e conta que gostou da experiência: “Não está sendo difícil, mas fácil também não está sendo. As coisas que eles vão falando a gente faz”, relata.
Para Sheila Altoé, a atuação dos moradores enquanto atores estreantes foi um sucesso: “Os atores foram maravilhosos. Todos se empenharam, tiveram muita paciência, acompanharam o processo inteiro”.
A expectativa agora é grande entre a comunidade. Todos querem assistir “A Viagem do Seu Arlindo” na telona. “A curiosidade é grande de todo mundo que está participando. A gente espera que o filme faça muito sucesso”, diz seu Sinésio. Para Sheila, fica também a expectativa de que a mobilização em torno do resgate das tradições se mantenha. “Foi plantada uma sementinha na comunidade. Na verdade, a semente já estava lá. Nós apenas regamos. E tem muitos frutos para serem colhidos: o caxambu, a contação de histórias são apenas alguns deles!”.
O projeto – “A Viagem do Seu Arlindo ” é uma das 15 histórias que compõem a sexta edição do Revelando os Brasis. Contadas por moradores de cidades com até 20 mil habitantes, as histórias (verdadeiras e inventadas) foram selecionadas no último Concurso Nacional de Histórias do projeto.
Doze estados têm histórias escolhidas nesta nova edição: Bahia (Lençóis e São José do Jacuípe); Minas Gerais (Barroso e Urucuia); Espírito Santo (Laranja da Terra e Vargem Alta); Alagoas (Quebrangulo); Ceará (Icapuí); Mato Grosso (Nossa Senhora do Livramento); Pará (Bom Jesus do Tocantins); Paraíba (São Domingos do Cariri); Rio Grande do Sul (Antônio Prado); Santa Catarina (Guarujá do Sul); São Paulo (Águas de Lindóia) e Tocantins (Arraias). A lista dos selecionados está disponível aqui.
O Revelando os Brasis promove a democratização do acesso aos meios de produção audiovisual, oferecendo aos moradores das pequenas cidades a possibilidade de contar suas próprias histórias em filmes. Realizado pelo Instituto Marlin Azul, com o patrocínio da Petrobras, o projeto é um instrumento de registro da memória e da diversidade cultural do país e revela novos olhares sobre o Brasil.
Nas cinco primeiras edições, entre 2004 e 2016, foram produzidas 180 obras, entre ficções, documentários e uma animação. Os filmes realizados são lançados nas comunidades participantes por meio do Circuito Nacional de Exibição Revelando os Brasis, que monta um cinema ao ar livre em ruas e praças dos municípios. Ainda na fase de difusão do projeto, os filmes são lançados em DVD com distribuição gratuita entre realizadores, secretarias, organizações sociais e culturais, cinematecas, universidades e cineclubes de todo o Brasil. As produções também são exibidas no programa de TV Revelando os Brasis, realizado em parceria com o Canal Futura.
Veja aqui a matéria da TV Gazeta Sul sobre as gravações do filme.