No amplo, profundo e rico mundo da imagem, outro personagem desperta emoções e sensações no cinema construindo e reconstruindo a história: o som. Ver um filme também é ouvir um filme porque a trilha sonora é tão fundamental quanto o conjunto de planos, enquadramentos, movimentos de câmera, tipos de lente e tipos de iluminação.
Os autores da turma de ficção do Revelando os Brasis VI tiveram no sábado (19/08) a primeira aula de som com Márcio Câmara. As Oficinas de Realização Audiovisual começaram no dia 14/08 e prosseguirão até 27/08, no Canal Futura, no Rio de Janeiro.
Para falar sobre o assunto, o professor fez uma retrospectiva histórica do som no cinema. Um dos períodos apresentados foi o da transição do cinema mudo (que o especialista prefere chamar de cinema surdo pois desde o final do século XIX as exibições eram acompanhadas por músicos contratados para tocar durante a sessão) e o cinema falado. Transição nada fácil para roteiristas, atores, diretores, produtores e técnicos da época. Muitos profissionais tiveram resistência e dificuldade de adaptação à nova linguagem e, alguns, até perderam espaço no setor.
A chegada da nova tecnologia nos anos 20 é tratada com descontração pela comédia musical “Cantando na Chuva” (1952), dirigida e coreografada por Gene Kelly e Stanley Donen. O professor exibiu um trecho do filme estadunidense cujo elenco marcou a história do cinema com as atuações inesquecíveis de Gene Kelly, Donald O’Connor e Debbie Reynolds.
O poder invisível – Muitos elementos sonoros estão contidos na trilha. Diálogos, ruídos, efeitos, som ambiente, música e até o silêncio, dentre outros, compõem a gramática sonora. Segundo o professor, é preciso pensar no som como se pensa na imagem com decisões baseadas no planejamento de cada cena.
“Existe uma teoria de que o som é 50% do audiovisual. Eu acho que ele está mais para 75% do audiovisual. Se desprender deste som é se desprender de uma possibilidade dramatúrgica muito forte. O som nos atua de maneira invisível e nos envolve e nos abraça de um modo que a imagem não faz. Hoje em dia, com todas as possibilidades tecnológicas, é necessário o uso do som de um jeito inteligente”, explica o professor.
Usar de forma inteligente e, intrinsicamente, de modo criativo. A partir das orientações de Câmara, os autores começaram a entender que a criatividade e a imaginação sonoras são valiosas na contação da história porque cinema é uma invenção, em outras palavras, é brincar com a realidade, seja uma ficção ou documentário.
“Os autores precisam ser instigados a pensar neste som de maneira construtiva. É preciso utilizar desta imaginação e desta criatividade para que este som, esta ideia sonora, este conceito sonoro sejam tão importantes, sejam tão vistos e pensados quanto se pensa na imagem. É necessário abrir os ouvidos para que possamos escutar, algo que fazemos muito pouco”, destaca o cineasta.
Saiba mais sobre o professor – Márcio Câmara é técnico de Som Direto desde de 1987. Foi indicado 5 vezes ao prêmio de Melhor Som Direto do Brasil na Academia Brasileira de Cinema e 4 vezes na Associação Brasileira de Cinematografia pelos filmes: A Ostra e o Vento; Lavoura Arcaica; Cinema, Aspirinas e Urubus; Amélia; Deus é Brasileiro; Peões; Homem do Ano; Elvis e Madona; Mutum; Os Desafinados e Zuzu Angel, entre outros.
Graduado em Cinema pela San Francisco State University, na Califórnia (1993), é Mestre em Cinema, com ênfase nos Estudos de Som, pela Universidade Federal Fluminense, em Niterói (2015).
Publicou, em 2016, o livro Som Direto no Cinema Brasileiro: fragmentos de uma história pela Editora RDS. Realizador audiovisual, dirigiu vários filmes com destaque para Rua da Escadinha 162 (2003); Identidades em Trânsito (2007); Torpedo (2009); Saudade de Andrea (2010); Doido Pelo Rio (2011); Joaquim Bralhador (2014); Quitéria (2016) e Do Outro Lado do Atlântico (2017).
Foto: Ratão Diniz/Instituto Marlin Azul